Tentei voltar nos podcasts que eu ando ouvindo pra lembrar onde ouvi essa frase, mas não encontrei.
O que eu lembro é que na conversa uma psicóloga ou psicanalista estava falando sobre como a aspiração dos pais para os filhos mudou. Por muito tempo, a família queria que os filhos alcançassem determinadas expectativas: ser médico, advogado ou alguma das profissões tidas como “bem pagas”, “de sucesso”.
De saco cheio de passar uma vida tentando alcançar as expectativas dos pais, os filhos foram se rebelando cada um do seu jeito, e hoje, o que temos é uma nova frase: ‘eu só quero que você seja feliz’.
Só isso.
Esse estado tão simples, tão fácil de ser alcançado, tão duradouro. Só que não.
Esse trechinho de podcast surgiu na minha memória depois de eu ser impactada por um conteúdo sobre a reação do público em Cannes, após assistir e bater palmas por 10 minutos para o filme brasileiro Ainda estou aqui - protagonizado por Fernanda Torres, com estreia prevista para janeiro de 25.
Um parênteses rápido: vocês conseguem se imaginar batendo palmas por 10 minutos? Acho muito curioso esse hábito de contar quantos minutos se bateu palmas em Cannes e isso ser uma métrica de sucesso. Se os braços todos cansarem, quer dizer que o filme é ruim? É a partir de 5 minutos que começa a contar como um sucesso? E o constrangimento de ficar ouvindo por 10 longos minutos as pessoas não pararem de bater palma? Não sei o que é pior: ficar batendo palmas ou ficar ouvindo elas 🙃
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O conteúdo que me chamou atenção sobre as reações de Cannes é esse aqui, da revista TPM, produzido pela jornalista Luiza Sahd. No vídeo, podemos ver a Fernanda Torres usando todas as ferramentas que possui para segurar o nervoso de uma das suas maiores conquistas profissionais: ser reconhecida e ovacionada em Cannes.
O ponto que a Luiza traz nos textos e que me conectei muito foi de como não estamos preparadas para grandes conquistas. Sendo a vida essa longa caminhada na qual em grande parte estamos “fracassando”, ou melhor, não conquistando exatamente o que gostaríamos, vamos nos acostumando a lidar com os percalços e ficando completamente despreparadas para as vitórias.
Você já pensou sobre isso? Já teve alguma situação que você se viu conquistando algo muito importante, que se sentiu feliz, mas acabou diminuindo a importância do momento ou do sentimento porque esperava que tudo fosse ser diferente?
Eu acho completamente maluca essa ideia que criamos do “chegar lá”. Das poucas experiências que eu tive de conquistar meus objetivos, eles não vieram nem um pouco parecidos com o que eu tinha imaginado.
Vou dar um exemplo. Eu cresci nos anos 90 assistindo filmes como A Proposta, com a Sandra Bullock, em que ela era uma profissional de sucesso. Ela andava com passos decididos até a sua sala de diretora, com seu tubinho preto, saltos altos e fazia toda a empresa ter medo dela.
Ela viajava pra lá e pra cá, porque isso era sucesso: não ter tempo e viver para o trabalho. Claro que esse filme era um romance e ela queria tudo. Ela queria ter sucesso na carreira e um boy bonito ao seu lado: no caso, Ryan Reynolds.
Na minha cabecinha jovem, e que segue sendo a mesma em alguns pontos, viajar a trabalho sempre foi um sinal de sucesso. A empresa deve gostar muito do seu trabalho para GASTAR e te mandar pra outro lugar fazer o que você faz, não é mesmo? Eles poderiam enviar qualquer pessoa, mas eles ESCOLHERAM você.
Lembro até hoje da minha primeira viagem paga por um freela para fazer uma pesquisa de campo. Eu estava me sentindo no auge com a minha malinha de mão e uma reserva de uma noite em Recife. Quando, mais recentemente, precisei fazer duas viagens no mesmo mês, sem ter aeroporto em Porto Alegre - o que exigia que eu passasse 6 horas em um ônibus até Floripa, pegasse um vôo até São Paulo e depois outro para o destino final - comecei a ver diferente os motivos de me escolherem.
Vários desses motivos diminuiam a importância do meu trabalho? Com certeza, afinal, como eu disse antes, eu cresci nos anos 90 e a confiança feminina não existia como pauta.
Eu poderia SÓ ficar contente? Claro que não. Não existe nesse corpinho uma massa muscular mental treinada para as conquistas. A alegria demora pra chegar, eu fico em dúvida se estou feliz pelas razões “certas”, vejo amigas contentes por outros motivos e começo a questionar qual parte eu não entendi. Em resumo, é desconfortável conseguir as coisas que a gente quer.
E mais, me parece que a gente cultiva mais espaços nas relações para reclamar do que para celebrar. Se a sua vida está tão boa, melhor deixar falar a amiga que tem algum problema para compartilhar. Ou melhor, fale só um pouquinho do que está bom e multiplique o tamanho dos desafios para parecer que tem várias coisas dando errado pra você.
Como assim?!
Felicidade é essa coisinha que dura 3 segundos e quando você se deu conta que sentiu ela já passou e parece só uma brisinha que fez um carinho na sua bochecha e agora está lá na frente balançando as folhas de uma árvore.
Por que, POR QUE a gente tem receio de contar sobre pequenas coisas felizes? Porque não sabemos lidar com a alegria, porque não queremos parecer deslumbradas com um nada que pra nós significa muito, porque sabemos que tem pessoas passando por dificuldades enormes enquanto a gente fica feliz com uma viagem paga pela firma só porque “quem não tem filhos tem mais facilidade de viajar”?
Fo da se.
Conte tudo sobre essa pequena conquista e porquê ela te fez feliz. Ela foi idealizada pela sua eu-do-passado e agora está percorrendo todo o seu corpo de adulta. Compartilhe com as amigas, especialmente as pequenas vitórias, porque assim a gente vai construindo essa massa muscular mental e física que nos prepara para celebrar as grandes conquistas.
Sem se permitir ser feliz, a gente acaba deixando a felicidade passar. E ela aparece várias vezes no dia, seja quando o sol consegue encontrar um espacinho entre as nuvens ou quando você é ouvida e reconhecida por uma atitude no trabalho.
E caso você, assim como eu, também tenha dificuldades em diferenciar felicidade de contentamento, a única saída é experimentar os dois e criar os seus significados. Se a felicidade passa pelo corpo todo antes de chegar na nossa mente, bora ficar bem pertinho desse lugar do sentir.
Para não deixar a felicidade fugir.
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~ Comecei a trabalhar em uma ONG na área de gestão de projetos e advocacy, e confirmei que não sei quase nada sobre política 🤡 O podcast que vem me ensinando de um jeito divertido sobre as pautas fundamentais e que eu indico fortemente é o Patada de Pantufa. Ele já acabou, mas o conteúdo é atemporal.
~ Tá triste, feliz, querendo cantar em voz alta ou remexer o ombrindo de levinho? Ouça o novo álbum da Liniker, Caju. Ela entrega o estilo que a gente já conhece, com featurings que combinam demais com as melodias + pagode, pop e feminejo. Tem tudo do melhor mesmo, com umas pitadas de orquestra quando convém, tá bom pra você?!
Sofri um aborto recentemente, perdi meu bebê. Uma das coisas que mais me orgulho foi a descoberta e como a vida do meu filho foi comemorado, vibrada e ficamos felizes. Sim, a vida tem que ser sobre comemorar momentos felizes. Acho que nos ensinam muito sobre isso, mas como se viver os momentos tristes. Faz sentido pra ti?